O que de essencial se poderia dizer a respeito deste livro de crônicas de Fran Martins, segundo pensamos, encontra-se na competente introdução de autoria de Sânzio de Azevedo, a quem foi atribuída a tarefa de selecionar e organizar os textos para publicação, convertida agora em realidade por iniciativa do Coordenador do programa editorial da Casa de José de Alencar, Prof. Antônio Martins Filho.
A esta altura dos acontecimentos, talvez se possa afirmar que já não faz sentido exumar a velha controvérsia segundo a qual a crônica não deve merecer o status de literatura. Não são poucos os que defendem a tese de que a crônica, por sua abordagem superficial dos fatos relacionados ao cotidiano, não passaria de uma simples vertente do jornalismo. Mas existem os que pensam de forma diferente. E para estes seria um sacrilégio colocar, no mesmo nível do jornalismo, as crônicas de um Rubem Braga, de um Fernando Sabino, de um Paulo Mendes Campos, de um Milton Dias, de uma Rachel de Queiroz ou de um Carlos Heitor Cony, este e aquela tidos e havidos como dois monstros sagrados desse gênero de narrativa nos dias atuais.
Fran Martins, jurista de projeção nacional, ficcionista com larga receptividade nos meios literários e intelectuais do país, nos revela agora uma nova faceta do seu talento ? de cronista. Pireu, Ida e Volta constituído, em parte, de narrativas de viagem e de outras crônicas sobre assuntos os mais variados, é livro de leitura agradável, escrito por um observador arguto das coisas e das pessoas. Veja-se esta breve passagem de um relato de Fran Martins, quando se encontrava a bordo de um desses navios que trafegam em rota internacional: ?No meio de tudo isto, debaixo de uma barraca de campanha, um velho gordo lia a Bíblia. Aquele devia ser um pastor de tantas ovelhas ruidosamente balindo no bojo da Águia do Adriático?.
Na crônica da página 98, Fran Martins faz referência a um telegrama, escondido numa das folhas de jornal, no qual se anunciava, em letras bastante miúdas, a morte do grande maestro italiano Arturo Toscanini. E observa que a notícia ocupava modesto espaço ?no meio de anúncios de sabão e de meias de nylon, cercado de notas de importância secundaríssima?. Enquanto isso, na primeira página do jornal, destacava-se uma bela fotografia de adolescentes ?dançando o Rock and Roll, o sucesso do momento?. À sensibilidade do cronista, não escapou o desapreço com que foi tratado um dos maiores regentes de orquestras de todos os tempos. No Brasil, as coisas não se passam de modo diferente. Aqui, as disfunções gástricas de jogadores de futebol costumam ganhar destaque nas primeiras páginas dos jornais.
Os reconhecidos méritos de narrador atribuídos a Fran Martins transparecem claramente neste livro de crônicas. Seu modo descontraído de expor e de comentar os fatos, ele o foi buscar, certamente, na sua vasta e sedimentada experiência de ficcionista de indiscutível aceitação popular. Mas o que importa agora, conforme diz Sânzio de Azevedo no final de sua introdução, é que o leitor tenha a oportunidade de ler estas crônicas ?de um dos maiores prosadores do Ceará nestes últimos sessenta anos?.
FRANCISCO CARVALHO
A esta altura dos acontecimentos, talvez se possa afirmar que já não faz sentido exumar a velha controvérsia segundo a qual a crônica não deve merecer o status de literatura. Não são poucos os que defendem a tese de que a crônica, por sua abordagem superficial dos fatos relacionados ao cotidiano, não passaria de uma simples vertente do jornalismo. Mas existem os que pensam de forma diferente. E para estes seria um sacrilégio colocar, no mesmo nível do jornalismo, as crônicas de um Rubem Braga, de um Fernando Sabino, de um Paulo Mendes Campos, de um Milton Dias, de uma Rachel de Queiroz ou de um Carlos Heitor Cony, este e aquela tidos e havidos como dois monstros sagrados desse gênero de narrativa nos dias atuais.
Fran Martins, jurista de projeção nacional, ficcionista com larga receptividade nos meios literários e intelectuais do país, nos revela agora uma nova faceta do seu talento ? de cronista. Pireu, Ida e Volta constituído, em parte, de narrativas de viagem e de outras crônicas sobre assuntos os mais variados, é livro de leitura agradável, escrito por um observador arguto das coisas e das pessoas. Veja-se esta breve passagem de um relato de Fran Martins, quando se encontrava a bordo de um desses navios que trafegam em rota internacional: ?No meio de tudo isto, debaixo de uma barraca de campanha, um velho gordo lia a Bíblia. Aquele devia ser um pastor de tantas ovelhas ruidosamente balindo no bojo da Águia do Adriático?.
Na crônica da página 98, Fran Martins faz referência a um telegrama, escondido numa das folhas de jornal, no qual se anunciava, em letras bastante miúdas, a morte do grande maestro italiano Arturo Toscanini. E observa que a notícia ocupava modesto espaço ?no meio de anúncios de sabão e de meias de nylon, cercado de notas de importância secundaríssima?. Enquanto isso, na primeira página do jornal, destacava-se uma bela fotografia de adolescentes ?dançando o Rock and Roll, o sucesso do momento?. À sensibilidade do cronista, não escapou o desapreço com que foi tratado um dos maiores regentes de orquestras de todos os tempos. No Brasil, as coisas não se passam de modo diferente. Aqui, as disfunções gástricas de jogadores de futebol costumam ganhar destaque nas primeiras páginas dos jornais.
Os reconhecidos méritos de narrador atribuídos a Fran Martins transparecem claramente neste livro de crônicas. Seu modo descontraído de expor e de comentar os fatos, ele o foi buscar, certamente, na sua vasta e sedimentada experiência de ficcionista de indiscutível aceitação popular. Mas o que importa agora, conforme diz Sânzio de Azevedo no final de sua introdução, é que o leitor tenha a oportunidade de ler estas crônicas ?de um dos maiores prosadores do Ceará nestes últimos sessenta anos?.
FRANCISCO CARVALHO
